Por que as pessoas escrevem mal?
- Gabriel
- 13 de jul. de 2021
- 3 min de leitura
Atualizado: 10 de out. de 2022
Quem nunca escreveu de forma complicada para impressionar alguém? Eu mesmo tenho algumas histórias com linguagem rebuscada de que não me orgulho. A maioria envolvia algum tipo de busca por aprovação — de um chefe, um orientador, uma namorada. Eu adorava usar palavras exóticas para mostrar meu domínio sobre a língua ou sobre algum tipo de assunto. Como eu era besta...
Histórias como as minhas reforçam a tese de que escrever complicado é uma escolha, ainda que feita sob pressão social em alguns ambientes, como o acadêmico. O argumento de quem defende essa tese é: a linguagem obscura camufla a falta de conteúdo do escritor e pode, inclusive, ajudá-lo a ser percebido como um intelectual. Em parte, isso acontece porque as pessoas costumam considerar profundos os textos que elas não entendem.
Não faltam acadêmicos denunciando como a linguagem obscura é usada para criar o efeito guru, isto é, como é usada para criar uma falsa aparência de intelectualidade. O mais famoso, e polêmico, certamente foi Alan Sokal, conhecido por satirizar o estilo de escrever dos intelectuais pós-modernos.

É tentador assumir o pior dos outros e concluir que escrever mal é uma escolha de má-fé. Mas temos que ter cuidado para evitar cair desnecessariamente em explicações conspiratórias. Para evitar paranoias, o linguista Steven Pinker sugere usar um princípio básico conhecido como "navalha de Hanlon". O princípio pode ser descrito da seguinte maneira: nunca atribua à malícia o que pode ser adequadamente explicado como estupidez.
A maldição do conhecimento
O ser humano é o animal mais inteligente da Terra, mas isso não quer dizer que nós não façamos coisas estúpidas. Por exemplo, tendemos a levar em conta apenas as informações que confirmam nossos preconceitos (viés de confirmação) e costumamos achar que pessoas bonitas são em geral mais habilidosas (efeito halo). Falhas de julgamento assim, conhecidas como vieses cognitivos, nos afetam em várias áreas da nossa vida.
Na comunicação, por exemplo, somos constantemente vítimas da maldição do conhecimento, um viés cognitivo que nos faz pressupor que os outros sabem tudo aquilo que sabemos. Por causa da maldição do conhecimento, temos dificuldade de nos colocar na posição do leitor que: 1) não domina os assuntos da nossa área de conhecimento; 2) não conhece o nosso jargão aprendido em anos de faculdade; e 3) não conhece o longo caminho para chegar a conclusões que hoje nos parecem óbvias.
É muito difícil lembrar o que não é saber de algo que hoje sabemos. Uma vez que aprendemos algo, não podemos desaprender (tradução adaptada do inglês: once you know, you can't unknow).

A maldição do conhecimento é uma grande limitação que interfere negativamente na nossa empatia. Em alguns casos, ela é inofensiva, por exemplo: quando ficamos frustrados que nossos amigos não conseguem descobrir o significado "óbvio" de mímicas e charadas que fazemos. Em outros casos, as consequências podem ser trágicas, por exemplo: quando um professor não consegue explicar uma matéria porque ele considera evidente tudo aquilo que ele está ensinando.

Como superar a maldição do conhecimento
Conhecer nossas limitações inconscientes, como a maldição do conhecimento, é o primeiro passo para lidarmos com elas. Somos péssimos para inferir o que outros sabem, esse é um fato bem documentado. Sabendo disso, o linguista Steven Pinker sugere algumas soluções para o problema da má escrita:
mostre um rascunho do seu texto para um leitor que represente seu público-alvo;
leia novamente o texto após um período de tempo, quando ele não for mais familiar para você.
Você deve estar pensando, "essas sugestões não trazem nenhuma novidade". De fato, a revisão de texto é super importante, sempre soubemos disso. A novidade é que agora sabemos mais por que submeter nosso texto para outro leitor é tão relevante. Nossos olhos estão cegos por causa da maldição do conhecimento. Por isso, outras pessoas são tão necessárias. Elas podem nos guiar para fora do labirinto de palavras que nós mesmos criamos.
Resumo da ópera: nunca subestimemos a nossa capacidade de escrever mal.
Até a próxima, pessoal!